a persistência do tédio

olhar sem ver e ver sem olhar

1.

“não sabemos mais ler imagens.”

“tenta olhar pra esse quadro por uns três minutinhos e pensa no que ele quer dizer.”

A persistência da memória: quadro surrealista de Salvador Dalí - Toda Matéria

2.

é isso que trabalho com meus alunos de vez em quando pra falar sobre a nossa percepção de tempo — naquela ideia de começar o ano com uma aula pretensamente reflexiva pra influenciar (positivamente) o ano letivo.

as carteiras em círculo. a vaga ideia da interatividade e diálogo entre os presentes.

o caminho escolhido foi o quadro "a persistência da memória" do dali.

3.

em aulas como essa, sempre chamo a atenção para o fato de estarmos circulados de imagens o tempo todo; tv, celular, cartazes, outdoors, óculos de realidade virtual. estáticas, interativas ou em vídeo — sempre existe algo que que olhar.

não há espaço para um tédio vazio e descompromissado.

todo tempo deve ser preenchido o tempo todo.

e se você estiver lendo esta edição enquanto faz alguma refeição, talvez você saiba exatamente do que eu estou falando.

tudo vira paisagem porque não demanda atenção. já foi percebido séculos atrás, a visão é como um músculo que é excitado involuntariamente enquanto a nossa atenção está presa em um lugar onde não estamos, em ações as quais não estamos fazendo, em coisas que não o são.

o olhar vago para o nada, ainda que o nada seja qualquer coisa, é um olhar metonímico — vê aquilo que deseja enquanto observa o que não deseja olhar.

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